edgar morin e a sabedoria
No livro "Amor, poesia, sabedoria", o filósofo Edgar Morin escreveu:
"De modo mais amplo, a hegemonia do ativismo e da praxis no mundo contemporâneo eliminou qualquer idéia de sabedoria.
O
mundo ocidental inventou um modelo prometeico de
dominação, de conquista da natureza, que afasta qualquer
idéia de sabedoria. O problema da vida e da morte foi ocultado
por esta agitação em que fomos envolvidos.
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Na auto-ética, e principalmente no plano elementar da recusa das
idéias de vingança e punição, é onde
se situa o centro da sabedoria. É nesta auto-ética para
si e para o outro que se encontram implicadas virtudes antigas que nos
remetem à via oriental: saber distanciar-se de si mesmo, saber
objetivar-se. Quero falar destas práticas que consistem em se
ver como objeto, sabendo integralmente que se é sujeito, em
poder descobrir-se, examinar-se, etc. Esse distanciamento pode ser
tentado de modo direto, como no caso de Montaigne. O esforço de
introspecção é vital, mas o que é pessimo
é que ninguém o ensina. Não somente não
é ensinado, mas é também ignorado, como entre os
psicólogos behavioristas, para os quais a única coisa que
conta é o comportamento, ou os neurocientistas para os quais o
que existe é o cérebro e os neurônios, e para os
quais a introspecção não tem nenhum valor.
É
necessário, entretanto, ensinar e aprender a saber
distanciar-se, saber objetivar-se e aceitar-se. Seria igualmente
necessário saber meditar e refletir a fim de não sucumbir
a essa chuva de informações que nos cai sobre a
cabeça, ela mesma sucumbida pela chuva do amanhã, que nos
impede de meditar sobre o acontecimento presente no cotidiano,
não permitindo que o contextualizemos ou que o situemos.
Refletir é ensaiar, e uma vez que foi possível
contextualizar, compreender, ver qual pode ser o sentido, quais podem
ser as perspectivas. Mais uma vez, para mim, a linha de força de
uma sabedoria moderna consistiria na compreensão.
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Se o mal que sofremos e fazemos sofrer reside na incompreensão
do outro, na autojustificação, na mentira a si
próprio (self deception),
então o caminho da ética - e é aí que
introduzirei a sabedoria - reside no esforço da
compreensão e não na condenção, no
auto-exame que comporta a autocrítica e que se esforça em
reconhecer a mentira para si próprio."