carl rogers e a terapia



No livro "Tornar-se Pessoa", o psicólogo Carl Rogers fala sobre terapia:

"Nenhuma abordagem que se baseie no conhecimento, no treinamento, na aceitação de algo que é ensinado, se mostra útil. Estas abordagens parecem tão tentadoras e diretas que, no passado, fiz uso de muitas delas. É possível explicar uma pessoa a si mesma, prescrever passos que devem conduzi-la para frente, treiná-la em conhecimentos sobre um modo de vida mais satisfatório. Porém tais métodos se mostram, em minha experiência, fúteis e inconseqüentes. O máximo que podem alcançar é alguma mudança temporária, que logo desaparece, deixando o indivíduo mais do que nunca convencido de sua inadequação.

O fracasso de quaisquer destas abordagens através do intelecto me forçou a reconhecer que a mudança parece surgir por meio da experiência em uma relação.
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Se posso proporcionar um certo tipo de relação, a outra pessoa descobrirá dentro de si a capacidade de utilizar esta relação para crescer, e mudança e desenvolvimento pessoal ocorrerão.
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Descobri que quanto mais conseguir ser genuíno na relação, mais útil esta será. Isso significa que devo estar consciente de meus próprios sentimentos, o mais que puder, ao invés de apresentar uma fachada externa de uma atitude, ao mesmo tempo em que mantenho uma outra atitude em um nível mais profundo ou inconsciente. Ser genuíno também envolve a disposição para ser e expressar, em minhas palavras e em meu comportamento, os vários sentimentos e atitudes que existem em mim. É somente dessa maneira que o relacionamento pode ter realidade, e realidade parece ser profundamente importante como uma primeira condição.
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Como uma segunda condição, acho que quanto mais aceitação e apreço sinto com relação a esse indivíduo, mais estarei criando uma relação que ele poderá utilizar. Por aceitação, quero dizer uma consideração afetuosa por ele enquanto uma pessoa de autovalia incondicional — de valor, independente de sua condição, de seu comportamento ou de seus sentimentos. Significa um respeito e apreço por ele como uma pessoa separada, um desejo de que ele possua seus própios sentimentos à sua própria maneira. Significa uma aceitação de suas atitudes no momento ou consideração pelas mesmas, independente de quão negativas ou positivas elas sejam, ou de quanto elas possam contradizer outras atitudes que ele sustinha no passado. Essa aceitação de cada aspecto flutuante desta outra pessoa constitui para ela uma relação de afeição e segurança, e a segurança de ser querido e prezado como uma pessoa parece ser um elemento sumamente importante em uma relação de ajuda.
Também acho que a relação é significativa na medida em que sinto um desejo contínuo de compreender — uma empatia sensível com cada um dos sentimentos e comunicações do cliente como estes lhe parecem no momento. Aceitação não significa muito até que esta envolva a compreensão. É somente à medida que compreendo os sentimentos e pensamentos que parecem tão terríveis para você, ou tão fracos, ou tão sentimentais, ou tão bizarros — é somente quando eu os vejo como você os vê, e os aceito como a você, que você se sente realmente livre para explorar todos os cantos recônditos e fendas assustadoras de sua experiência interior e freqüentemente enterrada. Essa liberdade constitui uma condição importante da relação. Aqui está implicada uma liberdade para explorar a si próprio tanto em níveis conscientes quanto inconscientes, o mais rápido que se puder embarcar nessa busca perigosa. Há também uma liberdade completa de qualquer tipo de avaliação moral ou diagnóstica, já que todas estas avaliações são, a meu ver, sempre ameaçadoras.
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Quando essas condições são alcançadas, torno-me uma companhia para o meu cliente, acompanhando-o nessa busca assustadora de si mesmo, onde ele agora se sente livre para ingressar.
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Gradualmente, minha experiência me fez concluir que o indivíduo traz dentro de si a capacidade e a tendência, latente se não evidente, para caminhar rumo à maturidade. Em um clima psicológico adequado, essa tendência é liberada, tornando-se real ao invés de potencial. Isto se mostra evidente na capacidade do indivíduo para compreender aqueles aspectos da vida e de si mesmo que lhe estão causando dor e insatisfação, uma compreensão que investiga, por detrás do conhecimento consciente de si mesmo, aquelas experiências que escondeu de si devido à sua natureza ameaçadora. Isso se revela na tendência para rêorganizar sua personalidade e sua relação com a vida em maneiras que são tidas como mais maduras. Seja chamando a isto uma tendência ao crescimento, uma propensão rumo à auto-realização ou uma tendência direcionada para frente, esta constitui a mola principal da vida, e é, em última análise, a tendência de que toda a psicoterapia depende.
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A terceira frase de minha afirmação geral era que a mudança e o desenvolvimento pessoal ocorreriam. Minha hipótese é que nessa relação o indivíduo se organizará tanto no nível consciente quanto naqueles mais profundos de sua personalidade de maneira a enfrentar sua vida de uma forma mais construtiva, mais inteligente, assim como mais socializada e satisfatória... Sabemos agora que os indivíduos que experienciam essa relação mesmo por um número relativamente limitado de horas apresentam profundas e significativas mudanças em personalidade, atitudes e comportamento, mudanças que não ocorrem em grupos de controle combinados. Nesse relacionamento, o indivíduo se torna mais integrado, mais efetivo. Exibe menos daquelas características que são normalmente intituladas neuróticas ou psicóticas, e mais daquelas características da pessoa sadia e em bom funcionamento. Ele muda a percepção que tem de si mesmo, tornando-se mais realista em suas visões do eu. Torna-se mais semelhante à pessoa que deseja ser. Ele se valoriza mais. Mostra-se mais autoconfiante e autodirigido. Apresenta uma melhor compreensão de si mesmo, tornando-se mais aberto à sua experiência, negando ou reprimindo menos a mesma. Torna-se mais aceitador em suas atitudes com relação aos outros, vendo-os como mais semelhantes a si mesmo.
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Se eu posso criar uma relação caracterizada da minha parte: por uma autenticidade e transparência, em que eu sou meus sentimentos reais; por uma aceitação afetuosa e apreço pela outra pessoa como um indivíduo separado; por uma capacidade sensível de ver seu mundo e a ele como ele os vê;
Então o outro indivíduo na relação: experienciará e compreenderá aspectos de si mesmo que havia anteriormente reprimido; dar-se-á conta de que está se tomando mais integrado, mais apto a funcionar efetivamente; tornar-se-á mais semelhante à pessoa que gostaria de ser; será mais autodiretivo e autoconfiante; realizar-se-á mais enquanto pessoa, sendo mais único e auto-expressivo; será mais compreensivo, mais aceitador com relação aos outros; estará mais apto a enfrentar os problemas da vida adequadamente e de forma mais tranqüila.
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Parece-me que no fundo cada pessoa está perguntando: “Quem sou eu, realmente? Como posso entrar em contato com este eu real, subjacente a todo o meu comportamento superficial? Como posso me tomar eu mesmo?”
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Ao invés de tentar sustentar a sua experiência na forma de uma máscara, ou fazer com que seja uma forma ou estrutura que não é, ser ela mesma significa descobrir a unidade e harmonia que existe em seus próprios sentimentos e reações reais. Significa que o eu verdadeiro é algo que se descobre tranqüilamente por meio da própria experiência, e não algo imposto sobre esta... Parece que gradualmente, dolorosamente, o indivíduo explora o que está por detrás das máscaras que apresenta ao mundo, e mesmo atrás das máscaras com as quais vem se enganando. De forma profunda e freqüentemente vívida, ele experiencia os vários elementos de si mesmo que se encontravam escondidos dentro dele. Dessa forma, cada vez mais ele se torna ele mesmo — não uma fachada de conformidade aos outros, não uma negação cínica de todos os sentimentos, nem uma frente de racionalidade intelectual, mas um processo vivo, que respira, sente e oscila — em suma, ele se toma uma pessoa.
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Por isso vou concluir rapidamente essa descrição da terapia, dizendo que é um tipo de aprendizagem significativa que ocorre quando cinco condições estão reunidas:

  • O cliente sente-se confrontado com um problema sério e significativo.
  • O terapeuta é uma pessoa congruente na relação, capaz de ser a pessoa que é.
  • O terapeuta sente uma consideração positiva incondicional em relação ao seu cliente.
  • O terapeuta sente uma compreensão empática aguda do mundo privado do cliente e comunica-lhe essa compreensão.
  • O cliente apreende num grau maior ou menor a congruência, a aceitação e a empatia do terapeuta."