erich fromm e o amor

Sobre o amor, o psicanalista Erich Fromm escreveu no livro A Arte de Amar:

  • Dificilmente haverá qualquer atividade, qualquer empreendimento que comece com tão tremendas esperanças e expectativas e que, contudo, fracasse com tanta regularidade, quanto o amor.
    Se isso se desse com qualquer outra atividade, todos estariam ansiosos por saber das razões do fracasso, por aprender como se poderia fazer melhor — ou então desistiriam de tal atividade. Como esta última alternativa é impossível no caso do amor, parece haver apenas um meio adequado de superar a falência amorosa: examinar as razões dessa falência e passar a estudar significação do amor.

  • O amor amadurecido é união sob a condição de preservar a integridade própria, a própria individualidade.

  • De modo mais geral, o caráter ativo do amor pode ser descrito afirmando-se que o amor, antes de tudo, consiste em dar, e não em
    receber.
    Que é dar? Embora pareça simples a resposta a esta pergunta, ela em verdade é cheia de ambigüidades e complexidades. O equívoco mais vastamente espalhado é o que entende que dar é “abandonar” alguma coisa, ser privado de algo, sacrificar. A pessoa cujo caráter não se desenvolveu além da etapa da orientação receptiva, explorativa, ou amealhadora, experimenta o
    ato de dar dessa maneira. O caráter mercantil deseja dar, mas só em troca de receber; dar sem receber, para ele, é ser defraudado. (Man for Himself, E. Promm, Londres, Routledge, 1949.) Aqueles cuja principal orientação é nãoprodutiva sentem que dar é um empobrecimento. A maioria dos indivíduos desse tipo, portanto, recusa dar. Alguns fazem do ato de dar uma virtude, no sentido de um sacrifício. Sentem que, por ser doloroso dar, deve-se dar; a virtude de dar, para eles, reside no próprio ato de aceitação do sacrifício. Para eles, a norma de que é melhor dar do- que receber significa que é melhor sofrer privação do que experimentar alegria.

  • Na esfera das coisas materiais, dar significa ser rico. Não é rico quem muito tem, mas quem muito dá.

  • Não obstante, a pobreza além de certo ponto pode tornar impossível dar, e assim é degradante, não só pelo sofrimento que causa diretamente, mas pelo fato de privar o pobre da alegria de dar.

  • A mais importante esfera de dar, entretanto, não é a das coisas materiais, mas está no reino especificamente humano. Que dá uma pessoa a outra? Dá de si mesma, do que tem de mais precioso, dá de sua vida. Isto não quer necessariamente dizer que sacrifique sua vida por outrem, mas que lhe dê daquilo que em si tem de vivo; dê-lhe de sua alegria, de seu interesse, de sua compreensão, de seu conhecimento, de seu humor, de sua tristeza — de todas as expressões e manifestações daquilo que vive em si. Dando assim de sua vida, enriquece a outra pessoa, valoriza-lhe o sentimento de vitalidade ao valorizar o seu próprio sentimento de vitalidade. Não dá a fim de receber; dar é, em si mesmo, requintada alegria.

  • O amor é uma força que produz amor.

  • Amor é preocupação ativa pela vida e crescimento daquilo que amamos.

  • Cuidado e preocupação implica outro aspecto do amor: o da responsabilidade. Hoje em dia, muitas vezes se entende a responsabilidade como denotando dever, algo imposto de fora a alguém. A responsabilidade, porém, em seu verdadeiro sentido, é ato inteiramente voluntário; é a resposta que damos às necessidades, expressas ou não expressas, de outro ser humano.

  • Se amo a outra pessoa, sinto-me um com ela, ou ele, mas com ela
    tal como é, não como eu necessito que seja para objeto de meu uso. É claro que o respeito só é possível se eu mesmo alcancei a independência; se puder levantar-me e caminhar sem precisar de muletas, sem ter de dominar e explorar qualquer outro. O respeito só existe na base da liberdade: “ramour est l'enfant de la liberte”, como diz velha canção francesa; o amor é filho da liberdade, nunca da dominação.

  • A mais fundamental espécie de amor, que alicerça todos os tipos de amor, é o amor fraterno. Entendo por isto o sentimento de responsabilidade, de cuidado, de respeito por qualquer outro ser humano, o seu conhecimento, o desejo de aprimorar-lhe a vida. Desta espécie de amor é que a Bíblia fala, quando diz: ama o teu próximo como a ti mesmo. O amor fraterno é amor por todos os seres humanos; caracteriza-se pela própria falta de exclusividade.

  • O amor fraterno é amor entre iguais; mas, na verdade, mesmo como iguais não somos sempre “iguais”; e por sermos humanos, temos todos necessidade de ajuda. Hoje eu, amanhã tu. Essa necessidade de ajuda, todavia, não significa que um seja desamparado e o outro poderoso. O desamparo é uma condição transitória; a permanente e comum é a capacidade de erguer-se e caminhar pelos próprios pés.

  • Só no amor aos que não servem a uma finalidade começa o amor a desdobrar-se.